Eu precisava falar, é verdade. Mas tentei conter. É isso que faço, me contenho. Ainda assim, daqui a pouco, tudo estará fora, ao vento, como se não estivesse tido aqui dentro em nenhum momento, mas não sem minhas impressões digitais mapeando todo o caminho até mim, porque tenho um gosto dúbio por ser pego, descoberto.
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As memórias têm me rondado, lembrando aquele fevereiro de solidão, liberdade, egoísmo, ansiedade e, em meio a tudo isso, e até como parte disso, felicidade. O tempo passou e agora a nostalgia me enche de passado, enquanto o futuro é tão vazio, em branco, como a folha à minha frente, com hesitação de se escrever.
"O que fazer?", a canção ecoa em mim, mesmo sem eu lembrar o resto da letra. Apenas essa pergunta e a melodia de fim de tarde, a olhar o mar, com o coração inquieto, mas a se acalmar, movimento inerente de quem muito sofre mesmo que às vezes por quase nada.
Mentalmente ando na orla, vago nas ruas, entro nos bares, vejo risos, escuto música, cambaleio, reproduzindo fielmente o que passou naquele carnaval, em que senti os toques e os suores. E quando o bloco passou, senti o calor do teu corpo enquanto tu me beijou com o gosto da cerveja ainda fresca nos teus lábios, na tua língua. Foi profecia e acaso, nós dois ali, no meio de todo mundo e tão sozinhos no nosso encontro gostoso, que deixou vontade de mais.
Hoje, por pouco consigo ouvir tua voz, hora macia, como uma onda suave ao quebrar, e às vezes forte, na rebentação, como se decidido a invadir, enquanto pareço resistir, mesmo querendo mergulhar, mas te repelindo com minhas barreiras naturais, ao mesmo tempo em que desejo que tu as quebre e redefina meus limites.
Outro dia vesti aquela cueca, manchada no cós, do dia que pintei meu cabelo sozinho no apartamento de um cômodo da cidade distante, a mesma que você tirou depois... Desculpa, por vezes derivo nessas lembranças como quem tem medo de fazer novas. É que queria estar aí, não no futuro, não só no passado, agora.